Umberto Eco ganha adaptação em quadrinhos no Festival do Livro de Paris

Umberto Eco ganha adaptação em quadrinhos no Festival do Livro de Paris

betty milan
Folha de S. Paulo, Livros, 12/05/23

 

 

O festival do livro se inaugurou recebendo no seu contexto 300 escritores de diferentes nacionalidades e tendo a Itália como país de honra. Segundo Umberto Eco, «  quem não lê dispõe de uma única vida : a própria ». O autor do Nome da Rosa esteve no centro dos acontecimentos porque o romance foi magistralmente adaptado para história em quadrinhos por Milo Manara, outro grande italiano.

Eco é conhecido como semiólogo, romancista prolífico e de respeitável professor da Universidade de Bolonha. Mas levava a sério a história em quadrinhos.  O Mito do Superhomem,  artigo publicado em 1976, é a prova disso. Por não ter preconceitos literários,  ele  dizia: « Quando procuro relaxar, leio um ensaio de Engels e quando quero algo mais sério, leio Corto Maltese ».

O festival celebrou a história em quadrinhos,  dando a Milo Manara um lugar especial. Numa entrevista para a revista Le Point, ele conta que entrou em pânico quando aceitou fazer a adaptação do Nome da Rosa. Como adaptar um romance que também é um ensaio teológico, uma reflexão erudita sobre o poder da língua, um retrato da Idade Média entre a luz e as trevas, um elogio do riso transgressor e um policial digno de Conan Doyle? Milo Manara é um  mestre do erotismo porém aceitou o  desafio de  fazer uma versão de  O Nome da Rosa – que se passa numa abadia beneditina – em quadrinhos.

Dado o  sucesso mundial, o romance foi adaptado para o cinema por Jean-Jacques Annaud com Sean Connery no papel do detetive e Christin Slater no do jovem Adso, secretário do detective.  Arnaud deu ênfase, no filme, aos diálogos. Manara se concentrou na dimensão visual do romance « que apresenta uma imagem surpreendente da Idade Média, a de uma fantasia sem limites, febril, simbolizada pelos desenhos fantásticos ou obscenos que existiam nas margens dos manuscritos da época, longamente descritos por Eco, um  mágico, como Felini. »

Eco celebra o conhecimento e a imaginação, através da biblioteca,  que se encontra no centro da abadia. Seus heróis são os monges iluminadores. Para criar o seu imaginário figurativo, Manara se inspirou nos afrescos de Giotto e, para não deixar de ser fiel a si mesmo,  exaltou a sensualidade, valendo-se da cena na qual Adso encontra a mulher que o inicia no amor.

Manara diz que, ao fazer a adaptação, refletiu sobre o significado do Nome da Rosa. Pensou, por um lado, na pobreza do Cristo, que contrasta com a desigualdade cada vez maior no mundo. Por outro, pensou « no direito de rir e de rir de tudo » diante do obscurantismo atual.

O Nome da Rosa de Manara foi pré-publicado todos os meses na revista italiana Linus. Na Itália, aparecerá em maio pela La Nave di Teseo – editora fundada também por Umberto Eco. Na França, em setembro, pela éditions Glénat. Com certeza sairá no Brasil, na contramão do preconceito – ainda vigente no país–  contra a história em quadrinhos,   que desserve a literatura.