Primeira autobiografia escrita por uma mulher no Brasil, um trabalho pioneiro
A partir dos anos noventa, com os gender studies e o movimento na França sobre a condição feminina, a literatura feminina se atreveu a fazer autobiografia. Tratava-se antes de um domínio estritamente masculino.
As mulheres começaram a se dizer, se contar. Christine Angot fala do incesto ao qual foi submetida. Catherine Millet, fala do prazer que sentia em ter sexo grupal, Marie Darrieussecq escreve sobre maternidade.
Depois de terem feito a revolução sexual, nos anos 60 e 70, as mulheres passaram do fazer ao dizer. Isso, o texto da Betty mostra muito bem. Há nessa literatura autobiográfica feminina — da qual a Betty é a primeira representante no Brasil — uma escrita de grande feminilidade e uma virilização do texto, na medida em que a mulher empresta do homem a sem cerimônia para falar do corpo do amante ou da amante, para falar de masturbação, em suma, de erotismo com palavras muito cruas. É o fim das cerimônias.
Acho fantástica a contribuição das mulheres para esse gênero, que era um gênero estritamente masculino. Temos que saudar o trabalho da Betty, um trabalho de grande importância, coragem, e volto a dizer pioneiro.
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Mary Del Priore, ex-professora de História na USP é escritora, especialista em História e atuou como colaboradora em diversos jornais e revistas científicas.