Exposição sobre atriz Sarah Bernhardt mostra figura cintilante até os dias de hoje

Exposição sobre atriz Sarah Bernhardt mostra figura cintilante até os dias de hoje

betty milan
Folha de S. Paulo, Ilustrada, 15/05/23

 

 

O Petit Palais é detentor do  retrato de Sarah Bernhardt, pintado pelo amigo da vida inteira,  Georges Clarin. No retrato, a atriz aparece estirada num divã  de veludo com um peignoir branco de seda que sublinha  a sua graciosa silhueta. O  Petit Palais também possui inúmeras esculturas feitas por Sarah Bernhardt. Por ocasião do centenário da sua morte, graças ao acervo, o museu inaugurou uma exposição com 400 obras, evocando os papéis emblemáticos do imenso repertório da atriz : Fedra, A Tosca, A Dama das Camélias…

O título da exposição é  A mulher criou a estrela. Um título que não podia ser mais verdadeiro. Sarah era filha de cortesã, foi cortesã também e amante do diretor do Théâtre de l’Odéon, que lhe confiou repetidamente o papel principal das peças. Por outro lado, utilizava  a própria imagem para fazer  publicidade das peças e criar o mito Sarah Bernhardt.

Além de atriz, foi escultora e pintora. Se autorizava a fazer o que desejasse e defendia as causas que lhe pareciam justas : causas feministas e também a de Dreyfus– judeu como ela –, oficial de origem alsaciana acusado de traição, degradado e deportado para a Ilha do Diabo–onde ficou cinco anos– antes que  sua inocência fosse comprovada.

A atriz interpretou papéis concebidos pelos maiores dramaturgos : Shakespeare, Racine, Victor Hugo, Edmond Rostand. Fez com eles turnês pelos cinco continentes.  Só para o Rio de Janeiro, foi três vezes : 1886, 1893 e 1905. Sua presença, intensamente noticiada na cidade, levou os cariocas a refletirem sobre o papel da mulher.

Além da vontade de fazer a cultura e a língua francesa brilharem no exterior, as turnês permitiam escapar a um ambiente teatral francês, às vezes hostil, e descobrir o mundo num trem especialmente feito para ela e do qual há várias fotos no Petit Palais. Só na turnê americana, Sarah fez 150 representações em 50 cidades. A propósito, ela escreveu : «  Atravessei os oceanos com o meu sonho de arte e o gênio da minha nação triunfou ! Plantei o verbo francês no coração da literatura estrangeira e é disso que eu mais me orgulho ».

O percurso da exposição retrata a carreira de Sarah Bernhardt, que Jean Cocteau chamava de « monstro sagrado » e diante de quem Victor Hugo se ajoelhou. Foi, aliás, depois de encenar a peça Ruy Blas que a atriz entrou na Commédie Française.  Os seus grandes papéis de atriz são evocados através  de  cartazes, cenários, figurinos, joias – muitas das quais foram feitas por Lalique especialmente  para ela.

Sarah é conhecida sobretudo como atriz, mas por também ser artista, uma seção inteira da exposição é dedicada a isso. Há  quadros e fotografias mostrando Sarah esculpindo e várias das suas obras estão expostas. As algas esculpidas, no final da vida, na residência de Belle-Isle são particularmente representativas do seu talento enquanto escultora.

Last but not least, Sarah também foi ícone da Art Nouveau. O seu nome é indissociável de Alfons Mucha graças aos cartazes imaginados pelo pintor no fim dos anos 1890. O sucesso dos cartazes se prolonga até hoje. Particularmente os de GismondaDama das Camélias.

A atriz e a artista tinham uma vida íntima que a exposição também mostra, apresentando o mobiliário e os objetos que lhe pertenceram e denotam o gosto por coisas estranhas –particularmente o morcego.

Ao morrer com 79 anos, em 1923, Sarah já era há muito uma verdadeira estrela, prefigurando o culto de que as grandes estrelas do cinema são hoje objeto.  Sua « voz de ouro » e a sua silhueta longínqua , atípica na época, fascinavam tanto o público quanto o mundo artístico e literário do qual ela foi objeto de culto.

A exposição mostra as diferentes facetas de uma mulher excêntrica que conquistou o mundo e cujo caixão foi seguido por 400 pessoas.  Morreu em 1923  e ainda fascina quem visita a exposição,  que vai até 27 agosto .