A Vitoria de Samotrácia é o simbolo da liberdade feminina
betty milan
Folha de S. Paulo, Colunas e Blogs, 15 de maio 2024
Nasci em São Paulo. Mas foi em Paris que eu renasci e quis viver. O porquê disso está no meu livro, Paris não acaba nunca: “Paris é uma cidade literária e todo escritor, de certo modo, é parisiense de nação, além de ser parrhisiense por sua relação com a palavra, porque parrhisia, em grego, significa liberdade de falar”
Escolhi Paris aos 20 anos quando vi no Louvre a estátua alada da Vitória de Samotrácia por ter enxergado nela uma mulher livre, tanto quanto eu podia ser na França ao contrário do Brasil. Se eu sentasse num bar para escrever ou ler o jornal, em Paris, ninguém ousava me importunar.
Quem vai para lá não pode deixar de ver a Vitória de Samotrácia que, na Grécia, ficava numa fonte e hoje está em destaque no alto de uma escadaria do museu. Paris exalta a figura feminina, como nenhuma outra cidade.
A estátua também é conhecida como Nice de Samotrácia porque representa Nice, a deusa grega da Vitória. Foi descoberta em pedaços, em 1863, nas ruínas de um santuário de Samotrácia. Fazia parte de uma fonte com a forma de proa de navio. Ao ler isso, a frase que me ocorreu foi « navegar é preciso, viver não ». Uma frase imortalizada por Fernando Pessoa.
O escritor navega de diferentes maneiras e eu não nasci para ser sedentária. Não sei o que isso tem a ver com o fato dos meus ancestrais serem imigrantes. A história da pessoa começa antes do nascimento e não acaba com a morte se ela não for esquecida. Digo isso no meu romance A mãe eterna, escrito durante os últimos anos da minha mãe. Graças ao romance, ela continua comigo. Assim como Paris, sempre que eu não posso estar lá. Porque Paris propicia continuamente a beleza.